A comida escassa devido à seca está fazendo piauienses caçarem roedores
para complementarem a alimentação. No distrito de Brejinho, no município
de Assunção do Piauí (273 km de Teresina), todos os dias no fim da
tarde é comum ver moradores saindo para as áreas de grutas para
colocarem armadilhas para pegar o “rato-rabudo”.
A
caça ao animal é artesanal, e a armadilha é feita com pedra e gravetos.
“Quando o rabudo passa pela armadilha, a pedra cai em cima e ele morre
sufocado. No dia seguinte, a gente vai logo cedo ao local buscar o
animal para já ser consumido no almoço”, disse o morador de Brejinho
Genivaldo Bezerra, 35.
A reportagem do UOL tentou
encontrar em alguma residência um rato para consumo, mas
os moradores explicaram que como passam muita fome consomem logo o
animal. “Como não tenho dinheiro para comprar carne, aqui é caçando,
tratando e comendo o rabudo. Ninguém fica com ele na geladeira por muito
tempo porque passamos fome e vamos logo comendo”, disse Bezerra.
Apesar
de a maioria dos moradores de Brejinho ter acesso ao programa Bolsa
Família, eles afirmam que o dinheiro que recebem não dá para comprar a
“mistura” para o almoço e acabam saindo à caça de ratos para servir de
carne na alimentação. A dona de casa Francisca Ramos da Silva, 41, não
se incomoda em contar à equipe de reportagem do UOL que a única carne consumida na casa dela é de rato.
“A
gente tem de se virar. Não plantamos nada neste ano por conta da chuva
que não veio. Ninguém aguenta almoçar com a comida pura e, como o
dinheiro que recebemos só dá para comprar arroz, feijão e macarrão,
comemos o rabudo para complementar”, disse Francisca, informando que a
carne do rabudo “é saborosa” e é sempre uma festa quando conseguem caçar
alguns ratos.
Maior que a ratazana
Segundo o “Guia dos Roedores do Brasil”, o rato-rabudo (Thrichomys apereoides) é
chamado por esse nome porque tem a cauda longa e mais peluda que as
demais pelagens do corpo. O animal é um mamífero roedor encontrado
tipicamente nas regiões Nordeste e Norte do Brasil e habita áreas
pedregosas e de vegetação aberta, como a caatinga e o cerrado, no
Brasil, e o chaco, no Paraguai.
A nutricionista Patrícia Lima
disse que apesar de o “rato-rabudo” viver em áreas inóspitas no sertão
nordestino o consumo da carne é perigoso devido à transmissão de doenças
por também estarem próximos a comunidades sem esgotamento sanitário.
“Apesar
de ser um rato que come somente frutas e vive em ambientes limpos na
mata, o rato-rabudo também vive perto de comunidades rurais, onde o
saneamento é precário, por isso eles não diferem dos nossos conhecidos
ratos, ratazanas. Devem ser vetores de inúmeras doenças. Os moradores,
quando caçam, podem se infectar dentro de casa quando ‘limpam’ e tratam o
rato para comer.”
A nutricionista explicou que para ter uma
alimentação correta, a dieta deve conter “carboidratos, proteínas e
lipídios, além de minerais e vitaminas”. “A proteína vai depender do
costume, dos seus hábitos alimentares das pessoas, que pode ser encontra
em carne animal e até em vegetais como a soja, grão de bico etc. Na
carne do rato com certeza tem proteína de origem animal.”
“É
triste saber que ainda existem pessoas que, devido as necessidades que
passam, se submetem a se alimentar de rato. Mas, por conta da pobreza no
Nordeste, não é de estranhar que se aventurem numa coisa dessa, porque a
fome, sentir fome por diversos dias, dá desespero. Acho que só num caso
de desespero para encarar isso.”
Fonte Uol